Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]
Apesar de ser motivo de muito debate, o paralelismo entre não decretar tolerância de ponto no passado Domingo Gordo de Carnaval por força da coerência com o discurso oficial do Governo da República sobre a diminuição dos feriados e respectivas pontes e o facto de que não decreta-lo significa somar mais uma aparente abolição de feriado aos dois já abolidos e, digo aparente já que a Terça-feira de Carnaval não tipifica um feriado, mas tradicionalmente um dia de folia autorizada pelo Estado que em termos práticos equivale e um feriado, o paralelismo existe na forma como o Estado pretende fazer aumentar a produtividade no seio da sociedade Portuguesa donde, por um lado em termos rigidamente lineares quanto mais dias de trabalho efectivo, maior será o resultado produzido pelos mesmos custos do factor trabalho, por outro lado, de forma puramente social, a abolição de um dia de descarga emocional e de sátira social e política representa um avolumar da falta de bem-estar emotivo que obviamente reduz a eficiência do trabalho.
Assim, tentou-se, em vão, promover a eficácia não se acautelando a eficiência que tal decisão traria, é por tanto fácil depreender que, o possível ganho de eficácia, isto é, mais um dia de trabalho efectivo, não compensaria a perda na eficiência, menor produtividade pelo tempo de trabalho bem como a fraca afluência de público aos serviços, notou-se que nesse dia, a afluência foi muito menor que nos restantes dias de semana, assim sendo, convém equacionar ser, a economia no seu todo, ganhou alguma coisa com esta decisão, a resposta é clara, não. Não só não ganharia na globalidade, se todos fossemos obrigados a comparecer nos postos de trabalho, efeito de contrariedade, como acabou por não ganhar marginalmente, já que a somar à quebra no bem-estar somou-se a falta de comparência dos utilizadores dos serviços.
Poderia então o Primeiro-ministro tomar semelhante decisão? Podia e pôde, mas não acautelou os efeitos que tal decisão provocaria, a ânsia em parecer bem aos olhos das instituições internacionais que, ainda que não De Jure mas De Facto, governam Portugal, a sua economia e até pretendem governar a sua Sociedade, o Governo d República quer passar para o lado exterior que está empenhado no prosseguimento das tão famigeradas reformas, que está empenhado em consolidar o crescimento e o pagamento das dívidas e, fá-lo tão bem e em tempo tão oportuno que intra-muros, as coisas acabem por cair no descrédito e acentuar o clima de inoperância entre o poder local e o poder central.
Num Estado cabalmente organizado, o poder local actuaria na sua génese semi-autónoma à função executiva devendo obediência às directrizes do poder central, mas quando este não actua para aprovação nacional mas para aprovação internacional, torna-se evidente a clivagem entre os dois, com as directrizes a serem pura e simplesmente ignoradas. De facto, podemos ficar algo preocupantes quanto ao futuro da nossa república e da nossa democracia, já que a ordem hierárquica do poder começa a ser posta em causa, não porque as autarquias estejam a ser arruaceiras ou propositadamente desobedientes, mas porque o Governo actua de olhos vendados para com o poder local.
Passos Coelho, com o seu pin da Bandeira Nacional, actua a duas velocidades, a vertiginosa dedicada à Troika, de prazos apertadíssimos e a braços com as pretensas reformas que no papel transparecem um “quê” de credibilidade e exequibilidade e a velocidade quasi-nula, isto é, dotar o país de reformas sérias, construtivas, não populistas e não tão pró-troika, reformas que não se destinem a dotar os outros países de crescimento à custa da estagnação da nossa própria economia afogada em dívidas e juros tão gentilmente cedidos a título de ajuda externa e, claro, a temporalidade das reformas, porque vai uma grande diferença em se “engendrar” reformas à velocidade da luz, tais como as portagens, as formas neoliberais de que não compete ao Estado investir na educação e na saúde obrigando tais sectores à auto-suficiência como se por mero decreto isso fosse possível, bem como toda e qualquer forma de fazer pagar serviços esquecendo que neste país existe uma das maiores cargas de impostos sobre os rendimentos (mas distribuídos, é certo) da União Europeia, sem a contrapartida das facilidades e dos serviços que o estado fornece, existe, portanto, uma enorme diferença entre reformas rápidas (de curto-prazo) e reformas a oito, doze ou vinte anos (de longo e muito longo prazo), reformas estruturais que levam muito tempo mas que fazem muita falta, o caso da reforma judicial, reforma do ensino, reforma da saúde, reforma do apoio social e, são várias que faltam ao país, que têm vindo a ser postas de lado pelo simples motivo que que o tempo que consomem a ser introduzidas (só para dar um exemplo, a reforma da educação primária e secundária demora doze anos, uma vez que tem que ser aplicada faseadamente) as torna reformas não apetecíveis pelos partidos que se revezam no poder, a ânsia de se perpetuarem no poder, leva-os (PS e PSD) a tomar especial cautela com este tipo de reformas, preferindo não as efectuar do que ter que assumir reformas em curso de mandatos anteriores e introduzir outras cujos resultados não serão visíveis de forma nenhuma na vigência do seu actual mandato.
Os partidos do sistema (PS e PSD) preferem as ditas obras de fachada, acções que se efectuam e consomem dentro dos quatro anos do mandato, é isso que traz votos e, votos são como pão para a boca a quem necessita do poder mais do que o poder necessita deles.
Ficamos portanto entre a espada e a parede, por um lado, o fosso das contas públicas e o humilhante pedido de intervenção externa, que obriga o Governo a uma postura serviçal perante os seus sócios no FMI e na União Europeia, por outro a ubiquidade do fantasma da campanha eleitoral a cada quatro anos, no fim sobra sempre um povo com quota-parte de responsabilidade, campeão de abstenção que em nada ajuda ao desenvolvimento da nação e, enquanto estas três pedras se perpetuarem no caminho de Portugal o país continuará a dar sucessivos e cada vez mais graves tombos, no plano económico e social.