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Publicaram-se nos dias que procederam à morte do antigo ditador líbio centenas de artigos contendo as fotografias e os vídeos do momento da captura de Muhammar Khadaffi, tão somente isso interessa aos cobiçosos olhos do público em geral, ver um antigo líder na rua da amargura. É que essas imagens, desprovidas de matéria noticiosa ou debate de qualidade, são um chamariz para as audiências e a maioria dos espectadores dos telejornais o que quer ver é isso mesmo, a imagem de um homem morto ou melhor ainda no momento da morte. Ainda ninguém se predispôs a debater os efeitos na política internacional, nos movimentos revolucionários do próximo oriente e o efeito que terá na intimidação dos ainda existentes regimes ditatoriais espalhados um pouco pelo mundo.

 

De facto a situação é muito mais complexa do que a simples queda de um ditador excêntrico e terrorista, têm implicações à escala global que ninguém conseguirá antever, por um lado faz-se necessário compreender os antecedentes históricos, sociais e fundamentalmente tecnológicos onde as tecnologias de informação e comunicação actuaram como ponto nevrálgico no gatilho das convulsões recentes. Não é à toa que regimes como o Chinês ou o Iraniano exercem ou tentem exercer censura sobre o vasto domínio que é a Internet, poder-se-à mesmo dizer que a Worl Wide Web é, neste momento, a maior ameaça a qualquer regime, seja ele democrático ou, e ainda com maior enfoque, ditatorial/censuratório. Se numa democracia as redes de comunicações começam a emergir como importantes meios de propagação da mensagem política e propagandística, o mesmo acontece, ou aconteceria nos regimes ditatoriais, de facto, existir serviços como o Facebook, Twitter e Blogs aliados a potentes motores de busca, são uma ameaça de crescimento exponencial e quanto mais se tenta controlar e censurar mais formas vão aparecendo para dar a volta ao censor do estado.

 

É neste clima de avanço das TIC que vimos a oclusão, primeiro simples protestos e, depois verdadeiras convulsões sociais, diferença, antes as populações só liam o que o estado emanava, agora não precisam de se mover porque a informação se lhes esbarra nos olhos. Egipto e Líbia são os flagrantes exemplos do falhanço dos regimes censuradores.

 

Porém, o mundo continuaria a girar como sempre fez se se trata-se de meras reposições de líderes e regimes, o que acontece é que iremos assistir durante a próxima década a inúmeros abalos na geopolítica mundial como não se via desde o fim da Guerra Fria. A Líbia Khadaffiana sempre foi um parceiro comercial privilegiado e no rol de países que o devem afirmar e não esconder está Portugal, afinal é um dos principais mercados de expansão de empresas ligadas sobretudo ao sector da construção civil, aliás inúmeros projectos de Khadaffi foram e alguns estão a ser construídos por empresas portuguesas. Neste ambiente de cooperação económica Portugal e a União Europeia fecharam continuamente os olhos às atrocidades de regime de Khadaffi, conquanto isso fosse benéfico para a economia europeia os direitos humanos ficariam regelados para meros e pontuais recados diplomáticos sem comprometer fortemente a imagem da Líbia internacionalmente até porque a Líbia tinha e tem sempre por onde negociar como é exemplo a Rússia.

 

Khadaffi, o amigo do ocidente como chegou a ser chamado no eixo Bruxelas-Washington, enquanto estiver no poder estava assegurado a sua "amizade". Este tipo de diplomacia, à la americana, tem sempre um revés, é que há regimes que não pretendem ceder muito às pressões ocidentais e olham com certa desconfiança para os seus congéneres que negoceiam com as ditas democracias europeias e americanas. O Irão é, depois da queda de Khadaffi, o regime onde certamente o exemplo da Líbia será mais amplamente estudado, não como uma opção válida de diálogo, pois que à mínima hipótese a NATO, a ONU e a UE se prontificam na ajuda à queda do regime e, isso é certamente algo que o regime Iraniano não quer. A lógica deverá ser portanto a da mútua desconfiança, por um lado a NATO e os Estados Unidos a vigiar constantemente o Irão, por outro lado o regime dos Ayatollah não dando espaço a falsas amizades. Desta lógica, poderá sair um extremar de desconfiança que e, infelizmente, muitos países, inclusivamente democráticos, já possuem, a capacidade de moldar a tecnologia nuclear para o bem e, claro, para o mal.

 

É então difícil perceber até que ponto devem as democracias estar atentas, como se procederão os desenvolvimentos no próximo oriente, desde a relação inimistosa entre Israel e o Irão, entre o Irão e os restantes países árabes, as revoltas emergentes na península arábica, todas estas questões e fulcralmente as suas respostas são as variáveis mais importantes na equação geopolítica e sobretudo na economia mundial. Ante um hipotético escalar de conflitos está uma Europa e uns EUA a sofrerem no seu território o definhar da sua economia há muito assente no domínio mundial e, não aguentarão outro "choque petrolífero", não sem antes mergulharem no abismo social e cultural. Do lado de fora espreitam as potencias emergentes, que esperam pelo sufoco do modelo social europeu, que já conheceu melhores dias e, do capitalismo norte americano que caminha lentamente para um controlo asiático, de resto, só a China representa mais de metade da economia e demografia de todos os países candidatos a potencias.

 

E a China, continua a ser um país onde, com excepção de Macau e Hong Kong, predomina um sistema de partido único, o Partido Comunista, que ressalve-se de comunista já só tem o nome, é a organização política mais numerosa do mundo com mais de 80 milhões de militantes e uma organização política com a dimensão que o PCC tem cada vez menos é governável centralmente o que traduz por si só uma incerteza quanto ao futuro do PCC e inerentemente quanto ao futuro da própria China, da sua economia e do seu papel como potencia emergente e em rápida ascensão. Isto favorece o surgimento de movimentos que fogem à esfera da orientação central propiciando portanto flutuações no pensamento geral no seio dos militantes do partido. É certo que o PCC atingiu estes números devido à promiscuidade entre a vida partidária e a vida pública, hoje em dia ser filiado no partido abre imensas portas na hierarquia do estado chinês e ninguém quer perder essas vantagens.

 

O partido continua-se no poder mediante a troca simples de favores económicos a grupos privados, tendo somente que os mesmos alinharem nas vagas directrizes culturais do partido. Nas próxima décadas é provável assistir-se a um desmoronamento do socialismo, de tipo chinês pela via interna do partido, facto que é exactamente o oposto ao desmoronamento pela via externa na antiga União Soviética.

 

A China é neste momento um colosso em ascensão, um colosso cuja classe baixa está aos poucos a ascender à classe média e isso entra em linha de colisão como o modelo económico global onde quem perde é a Europa nomeadamente o seu sistema de protecção social que está a ser posto em cheque devido aos custos do modelo social que penalizam fortemente a economia europeia através de imediata incapacidade de concorrer com a mão-de-obra barata asiática. É um momento onde a Europa se vê obrigada a apostar na qualidade em detrimento da quantidade cujo benefício está do lado dos asiáticos.

 

Desta forma o perigo de derrocada do modelo chinês acarreta prejuízos ruinosos para toda a economia mundial uma vez que a China se converteu na fábrica do mundo e grande parte para não dizer a maioria esmagadora das empresas mundiais, onde se incluem todas as multinacionais de renome desde o calçado às indústrias electrónicas e pesadas, está intimamente ligada à produção à escala planetária da China, pelo que a queda do gigante asiático significa a queda de grande grupos económicos ligados à indústria e consequentemente ao aumento em flecha dos produtos motivados pela falta de mão-de-obra e componentes baratos.

 

Assim a queda de Khadaffi não é só o fim de um regime mas pode dar azo a profundas transformações sociais, económicas e culturais um pouco por todo globo e os principais perdedores serão os europeus cujo declínio demográfico resultou numa pesadíssima factura social que obrigatoriamente tem que ser paga, desta forma a diplomacia mundial tem que ser hábil o suficiente para permitir que tais regimes remanescentes de democratizem sem porém por em cheque o edifício económico mundial que a cair levaria ao caos em todo o mundo ocidental e inverter irremediavelmente o avanço económico do ocidente por um período francamente superior a meio século. Estes princípios têm que ser salvaguardados, o apoio social, a democracia plena e verdadeira e os direitos humanos, constatando que isso em boa parte já existe no mundo ocidental, não tanto quanto o desejável, mas seguramente mais que nas outras partes do globo e, ao mesmo tempo assegurar o avanço democrático nas áreas e países onde ele é deficitário sem, contudo, o fazer de uma forma imprudente, irracional e acelerada que deitaria por terra o modelo social vigente na Europa.

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Afixado às 00:38


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De Gonçalo Patricio a 28.10.2011 às 01:33

Khadaffi foi apenas um joguete nas mãos dos países poderosos na NATO! Os EUA no que toca a "amizades" com ditadores ou terroristas sabemos muito bem como eles são... metem-nos no poder, manipulam e quando não são necessários "deitam-os fora". Como foi o caso do Saddam no Iraque, e a expulsão dos Taliban do Afeganistão (depois dos EUA terem ajudado os Taliban a subir ao poder, e até fornecendo armas).
O erro do Khadaffi foi ter desistido do armamento nuclear, se não tivesse feito isso a "cantiga" seria outra...

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